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quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Batalha Naval durante a Guerra da Cisplatina

Velhos e bons livros acabam esquecidos em prateleiras de bibliotecas e por causa disso bons textos deixam de vir ao conhecimento público como, aliás, já escrevi antes e ora reitero. Pensando nisto reproduzo este fragmento de um deles, que se vê a seguir, com os devidos créditos, para assim divulga-lo aos que porventura leiam este blog. Tendo também ilustrado ao mesmo com algumas imagens recolhidas na WEB.


O tema versa sobre um episódio naval da  Campanha da Cisplatina, que foi um conflito ocorrido entre o Império do Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata (hoje Argentina), no período de 1825 a 1828, pela posse da Província Cisplatina, atual República Oriental do Uruguai. Aquela campanha findou com o reconhecimento da independência política deste último, com isto contentando os dois países adversários, nenhum dos quais ficou legalmente com aquele território.


“DEFESA HEROICA DA "IMPERATRIZ"


(Abordagem a fragata Imperatriz – tela de Trajano Augusto de Carvalho)

“O almirante William Brown, comandante em chefe da esquadra argentina durante a Campanha Cisplatina, não era homem que esmorecesse diante do primeiro insucesso. Os reveses mais sérios — e não foram poucos os que ele sofreu nos três anos dessa luta — os reveses mais sérios como que o predispunham para novas arremetidas contra o adversário temível que o cercava sempre por todos os lados, impedindo-lhe os movimentos. Por isso mesmo na tarde daquele dia — 27 de abril de 1826 — depois do ataque malogrado à Colônia do Sacramento, onde perdera o Belgrano, e do combate infeliz do dia 11 em que fora batido e obrigado a fugir, ele determinava as últimas providências para um novo cometimento audacioso. Durante a noite seria tomado por abordagem um dos navios brasileiros. E o escolhido era precisamente a fragata Nictheroy, do comando de James Norton, contra quem remordia o almirante fundo despeito e não menor desejo de vingança.

Tudo estava preparado por mão de mestre, carinhosamente, desveladamente, e nem o mais insignificante detalhe fora esquecido. Os marinheiros destinados à abordagem — escolhidos a dedo entre os mais valentes e robustos — já haviam recebido camisetas brancas para se diferençarem dos nossos, e já estavam devidamente industriados e treinados sobre o que deveriam fazer no momento preciso; calafates e caldeireiros tinham sido designados para, ao primeiro instante, pregar as escotilhas e cortar as amarras do navio abordado; o pessoal das gáveas recebera pistolas e granadas de mão para, do alto, melhor alvejar a nossa gente.

Saído de Buenos Aires um dia antes com seis de seus melhores navios, Brown fizera realizar nessa tarde o último exercício, com resultado excelente; e ao comunicar as últimas disposições a Thomas Espora, seu capitão de bandeira, cruzando em passos enérgicos o tombadilho da capitânia, ele esfregava as mãos, risonho, visivelmente satisfeito. Tinha como certo o feliz êxito do empreendimento planejado.




(Bandeira argentina por volta de 1820)


Ao cair da noite suspenderam os navios argentinos das proximidades do banco Ortiz, onde se achavam, e velejaram com destino a Montevidéu, em cujo porto estava fundeada a nossa esquadra. Navegavam na seguinte ordem: corveta 25 de Mayo (capitânia), brigues Independencia, Republica, Balcarce, Congresso e a escuna Sarandi.

Ora, regressando de uma viagem a Maldonado, a fragata Imperatriz fora fundear à terra de toda a esquadra brasileira, em frente ao forte de S. José, a fim de arriar e refrescar o aparelho. Seu comandante, o bravo e ilustrado capitão de fragata Luiz Barroso Pereira, imediato de Taylor no célebre cruzeiro da Nictheroy, não olvidara, todavia, as precauções aconselháveis na emergência, e conservou seu navio preparado para qualquer eventualidade.


(Comandante Luiz Barroso Pereira)

Noite clara, de luar belíssimo. Cerca de 11h45m o cabo de quartos da Imperatriz dirige-se ao primeiro-tenente Lúcio de Araújo, oficial de serviço, e previne-o da aproximação de seis navios. A princípio, dado o sossego que se notava nos demais navios brasileiros, o oficial não quis acreditar se tratasse de inimigos. Um marinheiro de nome Ivadish, aprisionado pouco antes na Colônia, reconhece, entretanto, a capitânia de Brown, e logo a guarnição foi acordada sem ruído, acorrendo todos a seus postos de combate.

“— Aonde está fundeada a "Nictheroy?” — pergunta Brown em inglês, com o auxílio do porta-voz, ao aproximar-se da Imperatriz, que ele supunha ser a fragata americana Doris. — Na mesma direção, mais à frente! — responde-lhe no mesmo idioma o voluntário Mariano Rosquellas, indicando a corveta inglesa Tweed.

Os navios argentinos seguem no rumo indicado; mas, verificada a burla, viram de bordo, em contramarcha, e a 25 de Mayo descarrega seus canhões sobre o navio brasileiro. Este já estava inteiramente preparado para o combate. Em vão, porém, seu bravo comandante tenta enfrentar o inimigo a vela: a primeira descarga inutilizara-lhe o velame, cortara-lhe os cabos de laborar. Com o auxílio do leme, entretanto, ora orçando, ora arribando, evita o Independência que tenta a abordagem pela proa e descarrega cerrado tiroteio sobre a capitânia buenairense que lhe enfiara o gurupés pela almeida da popa, esmagando-lhe um escaler. A luta se desenrola encarniçada, em lances de heroicidade e de bravura. O segundo-tenente Lopes da Silva, chefe do destacamento de abordagem, desdobra-se com a sua gente numa atividade pasmosa. Lúcio de Araújo, imperturbável, na mesa do traquete, desafia a peito descoberto as fúrias do inimigo, cujas fileiras vão desfalcando com certeiros tiros.

No mais aceso da peleja sobrevém-nos desgraça irremediável. O comandante Barroso Pereira, atingido por uma bala em pleno peito, tomba nos braços do homem do leme. Mas ainda morrendo, ele revela a têmpera do verdadeiro patriota. Alteia o busto ferido e brada à marinhagem que o adorava: Não se assustem camaradas, não foi nada! Substitui-o incontinente o capitão-tenente Rabelo da Gama, imediato, e já agora há uma chama nova a animar os defensores da fragata que ansiavam vingar a morte do seu comandante.

Diante da resistência heroica, Brown reconhece irrealizável o seu intento, e resolve interromper a luta. O gajeiro da gata, porém, passa o chicote do braço grande pelo gurupé da 25 de Mayo e conserva-a mais algum tempo sob o fogo cerrado da nossa fuzilaria, bem como dos dois guardas-leme, enquanto a bateria toda responde ardorosamente ao fogo das demais unidades argentinas.

   Uma hora e quinze minutos durava o combate quando o inimigo bate em retirada, precipitadamente, pois os outros navios da esquadra brasileira se aproximavam atraídos pelo ribombar dos canhões.

   À frente deles, destemeroso, vinha Norton com a sua garbosa Nictheroy. Fora-se o ensejo de, mais uma vez, medir forças com Brown. Este, porém, não perderia por esperar..."


Fonte:
PRADO MAIA, João. Através da história Naval Brasileira. São Paulo: Companhia Editora  Nacional. Edição 1936.




(Bandeira brasileira de então)





Elucidou o Barão do Rio Branco em livro que escreveu as  razões, que levaram Barroso Pereira a ser ferido mortalmente durante o embate naval. Quando escreveu:


 “Colocou-se Barroso Pereira no lugar mais perigoso do navio, contra a vontade de seus oficiais; e, com os braços cruzados, aí se conservou através de uma nuvem de balas. Alcançou-o uma delas poucos minutos antes do começo da ação. Sem dar um só grito, levou ele com calma as mãos ao peito: – Não foi nada camaradas – exclamou ele. Recuou três passos e caiu gritando: “Ao fogo!” Baldias, frustâneas, foram às esperanças do que supunham vê-lo tornar a si. Poucos segundos depois expirou.”


Fonte:
PARANHOS JÚNIOR, José Maria da Silva. Obras do Barão do Rio Branco VII: biografias. – Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2012.



Não custa se asseverar, que tanto no Brasil como no exterior, naquela época os comandantes de forças terrestres ou marítimas agiam sempre assim, para estimular os seus subordinados.

Em recordação ao mesmo seu nome foi dado ao Navio de Transporte de Tropas Barroso Pereira - G 16 – que foi construído sob encomenda da MB no Japão e desempenhou muitas fainas marítimas para esta entre 1955 e 1995. Tanto que durante seus quarenta anos de serviço atingiu as marcas de 888.370 milhas navegadas  e 3.420 dias de mar.


(Navio para transporte de tropas BARROSO PEREIRA)




Fontes das principais imagens:


Wikipédia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeira_da_Argentina . Acesso em: 02/01/2018.

Navios de Guerra Brasileiros. NTrT Barroso Pereira - G 16. http://www.naval.com.br/ngb/B/B022/B022.htm . Acesso em: 02/01/2018.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Episódios da guerra submarina relacionados ao Brasil na II Guerra Mundial.


                                     

(Adolf Hitler)

O Brasil entrou em guerra contra a Alemanha e Itália em 31 de agosto de 1942, face ao afundamento nas costas nordestinas de cinco navios mercantes brasileiros, pelo submarino germânico U-507 durante o mesmo mês. A incursão fora ordenada pelo Comodoro Karl Dönitz, comandante da arma submarina do primeiro país, com plena autorização do governo nazista.

Não houvera da parte do Brasil qualquer ação bélica contra a Alemanha, os navios brasileiros eram de carga e passageiros e singravam águas costeiras do Brasil. Mas, o regime nazista estava muito descontente com nosso país, por ações a ele atribuidas, mas bem proprias de um país soberano no exercício desta e durante um conflito bélico mundial. Daí o ataque não provocado, que feriu os brios brasileiros, molestou seu governo e que levou a nossa declaração de guerra.

A guerra mundial em toda a sua duração não atingiu a porção continental, nem as ilhas oceanicas do Brasil, mas foi realmente dura nas águas dos mares. O Brasil já perdera por ataques germanicos e italianos entre 22 de março de 1941 e 28 de julho de 1942 quinze navios, sempre em águas distantes de nossa terra. Após o início oficial da guerra e até o seu final perdeu mais vinte outros sempre por ataques maritimos. Só uma boa notícia a população recebeu, quando soube que o  U-507, responsável pelo massacre de agosto de 1942, fora afundado no dia 13 de janeiro de 1943, no Oceano Atlântico, aproximandamente a 100 milhas do litoral do Ceará, por cargas de profundidade de um avião Catalina americano, causando a morte de todos os seus 54 tripulantes.

Escreveu sobre tudo isto seria bem extenso, mas vou tratar aqui apenas do algoz de um destes barcos, o Tutoia, que em 1º de julho de 1943, foi  torpedeado ao largo de Iguape, litoral sul de São Paulo, causando a morte de sete pessoas. Aquele foi o Unterseeboot 513 (U-513), um submarino alemão de longo alcance, pertencente à Kriegsmarine.

A seguir uma parte de sua história e algo das vidas de seus tripulantes neste vídeo cuja fonte é nele claramente indicada:


<https://youtu.be/8TmfmLj3Q0M>



Mas, tudo nesta vida se acaba, e numa guerra ainda mais rápido, muitas vezes de maneira trágica. Pois, a mortífera embarcação nazista também finou-se, pois foi afundada na costa brasileira nas imediações de São Francisco do Sul, estado de Santa Catarina, em 19 de julho de 1943 por cargas de profundidade. Desapareceram com o U-boot 46 tripulantes, sobreviveram 7 entre eles o comandante, Friedrich Guggenberger. O submarino foi redescoberto em 14 de julho de 2011, à profundidade de 135 m, por pesquisadores brasileiros.


Fontes:

Wikipédia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/Karl_D%C3%B6nitz#Segunda_Guerra_Mundial. Acesso em: 02/01/2018.

Wikipédia, a enciclopédia livre. https//pt.wikipedia.org/wiki/U-513.  Acesso em: 02/01/2018.

Wikipédia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_navios_brasileiros_atacados_na_Segunda_Guerra_Mundial#Lista_dos_navios_atacados . Acesso em: 02/01/2018.  

terça-feira, 9 de junho de 2015

Populares no século XIX bombardeiam navio de guerra britânico no Brasil (III).

(continuação...)


O navio inglês levou a pior. Combatendo em águas interiores e com suas manobras limitadas pelo reboque dos navios apresados, o Cormorant sofreu importantes danos. Os próprios brigues Dona Ana e Sereia foram seriamente atingidos e o capitão Schomberg afundou-os na entrada da baía. Mas, a galera Campeadora já tripulada por ingleses seguiu viagem até Serra Leoa, na África. Entre os ingleses houve três baixas, uma fatal e outras duas apenas feridos. No lado dos brasileiros os danos materiais foram mínimos e houve apenas feridos leves.

Como consequência de suas ações bélicas os paranaenses que atentaram contra o navio britânico foram recebidos com honras pela população da cidade, mas não é errado se dizer  que muitos deles não passavam de pessoas que viviam do tráfico de escravos.

A reputação da Royal Navy havia sido maculada. Um moderno navio inglês ser atacado por uma velha fortaleza com armamento antigo, improvisado e guarnecido, em boa parte, por civis destreinados já era motivo de vergonha suficiente.  Os atos ocorridos na baia de Paranaguá acirraram os ânimos do governo britânico, que exigiu uma reparação formal do governo brasileiro.

Naquele tempo D. Pedro II, que reinava e governava o Brasil desde os 15 anos de idade (1840) estava perto dos 25 anos e já tomara bom pulso sobre a política e o país. Coube, porém, ao seu governo atuar, o que coube ao Ministro da Justiça, Eusébio de Queiros, que propôs uma lei que extinguia o tráfico negreiro no Brasil, a qual foi aprovada pelo parlamento e sancionada pelo monarca (Lei no. 581 - de 04 de setembro de 1850).

Sobre ela escreveu Eliardo França Teles Filho:  

Consta que após o fim do tráfico, o país entrou em uma fase de prosperidade econômica, uma vez que boa parte dos capitais antes investidos no tráfico ilegal de escravos se converteu para a economia formal. Por outro lado, atribui-se a esta lei a virtude de ter dado início ao processo de transformações econômicas que levaria à decadência da forma de produção escravista. Isto porque o fim do tráfico gerou uma carência de escravos, levando ao aumento de seu preço e ao direcionamento do estoque existente apenas para as atividades produtivas mais dinâmicas, isto é, a plantação de café. Com isso, abriram-se postos de trabalho para a mão de obra livre nas zonas urbanas e nas regiões não produtoras de café, dando início à transição da economia escravista para a economia com mão de obra assalariada”.
            
                         
Bom se saber, que naquela época o Império do Brasil preparava-se lenta e cuidadosamente para intervir no Prata e derrubar Juan Manuel de Rosas, o ditatorial governante argentino, algo que precisaria ao menos da complacência britânica para ser concretizado. Daí ter então, que “pisar em ovos” em tudo que se referisse a irascível Albion, o que também explica a leniência de suas ações com o poderoso Império Britânico diante do ultraje, que este sofrera em Paranaguá.

No fundo ainda D. Pedro II era contra a escravidão dos negros e o ministro Eusébio de Queiroz compartilhava deste ideal. Mas, as resistências internas a sua abolição eram bem grandes e o Estado Imperial temia precipitar uma grave crise política e econômica no país se a decretasse.

De qualquer forma, a Lei Eusébio de Queiroz produziu lentos efeitos na sociedade, custando a pegar, mas isto acabou ocorrendo, mas bem aos poucos , tanto que só em outubro de 1855 se verificou o último desembarque de escravos em Pernambuco, cujos implicados foram presos.

                                                              


(o Imperador D. Pedro II)


Com o passar do tempo o capitão Schomberg alcançou o posto de almirante já no final de sua carreira. Já o capitão Barbosa, comandante da fortaleza, por não impedir a tomada do quartel por civis, foi rebaixado à condição de soldado de terceira categoria. Quanto ao “Bill Aberdeen” o governo inglês veio a revoga-lo em 1869, o que demonstra que só então eles se convenceram que o tráfico de escravos para o Brasil já cessara. Quanto a velha fortaleza, há muito desativada, ela sofreu uma restauração entre 1985 e 1995, em parte graças a recursos do Banco Mundial e hoje em dia abriga um pequeno museu. Destaco que as imagens dela aqui estampadas são as atuais.



Fontes:
 
TELES FILHO, Eliardo França. Eusébio de Queiroz e o Direito: um discurso sobre a Lei n. 581 de 4 de setembro de 1850. Rev. Jur., Brasília, v. 7, n. 76, p.52-60, dez/2005 a jan/ 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/rev_76/artigos/PDF/EliardoFranca_Rev76.pdf 
Acesso em: 02/05/2015

FROTA, Guilherme de Andréa. 500 ANOS DE HISTÓRIA DO BRASIL. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército. Edição 2000.

Wikipédia, a enciclopédia livre. http://pt.wikipedia.org/wiki/Incidente_de_Paranagu%C3%A1 Acesso em: 30/04/2015.

Wikipédia, a enciclopédia livre.  http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_II_do_Brasil#Consolida.C3.A7.C3.A3o Acesso em: 30/04/2015.

Tok de História. http://tokdehistoria.com.br/tag/forte-de-paranagua/ Acesso em: 30/04/2015.

Fortalezas.org. http://fortalezas.org/?ct=fortaleza&id_fortaleza=433 Acesso em: 30/04/2015.

Panoramio. Google Maps. http://www.panoramio.com/photo/2524920 Acesso em: 30/04/2015.

Multirio: História do Brasil. http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo02/queiros.html. Acesso em: 03/05/2015.
 
 

 
 
 

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Populares no século XIX bombardeiam navio de guerra britânico no Brasil (II).

(continuação...)


Uma ação militar britânica e a imediata reação armada de vários brasileiros:

Diante destas ações, elementos do povo começaram espontaneamente a agir contra os britânicos por conta própria, desde agressões físicas à tripulantes nas ruas do Rio de Janeiro, como também nas demais cidades e até mesmo nas praias, onde desembarcavam. Por exemplo, em 1850, um marinheiro inglês foi morto dentro do escaler do HMS Rifleman, quando um grupo de civis armados surpreendeu os marinheiros ingleses, que se refugiavam em pequena embarcação de uma forte tempestade no atual município de Guarujá, litoral paulista. Esta ação dos paulistas decorreu daquelas atitudes da marinha inglesa na costa brasileira, que irritavam a sua população.

Mas, a força naval britânica era realmente muito poderosa. Uma parcela desta, chegou em setembro de 1849 as águas sul-americanas, sob o comando do Contra-Almirante Barrington Reynolds. A nau capitânia era a fragata HMS Southampton, sob o comando do Capitão Cory, guarnecida com 50 peças de artilharia, coadjuvada por outros navios: a corveta a vapor HMS Sharpshooter, a corveta a vapor HMS Rifleman sob o comando do Tenente Crofton, a corveta a vapor HMS Tweed, a corveta a vapor HMS Harpy e a corveta a vapor com rodas laterais HMS Cormorant sob o comando do Capitão Herbert Schomberg. Haviam os navios de apoio: HMS Crescent e HMS Hermes, os quais atuavam para dar apoio àquela esquadra, trazendo suprimentos e carvão da Inglaterra. As corvetas a vapor eram basicamente equipadas com quatro canhões laterais de calibre 64 e duas torres sobre eixos com canhões de calibre 80.

O HMS Cormorant durante patrulhamento cruzou, na altura do litoral paranaense, o caminho de alguns navios brasileiros com aparentes evidências de transporte  negreiro. Os navios brasileiros não obedeceram à ordem de inspeção da nau inglesa e tomaram rumo a cidade portuária de Paranaguá. No dia 29 de junho de 1850, a corveta inglesa adentrou a baia de Paranaguá em perseguição a eles. No porto já se encontravam outros barcos. Neste dia o capitão inglês aprisionou os brigues Dona Ana e Sereia e a galera Campeadora. Note-se que nenhum cativo encontrava-se a bordo de qualquer deles, e se eles ali antes de achavam foram todos desembarcados a tempo. Para não ter o seu navio aprisionado o capitão do brigue Astro, José Francisco do Nascimento, afundou o seu navio, dizendo-se que os escravos que ali havia pereceram nisto.

Seu comandante sentia-se a salvo de insucessos, pois o Cormorant era uma corveta de casco de madeira, possuía propulsão a vapor e a vela, com uma grande roda de pá na lateral. Tinha um deslocamento de 1.590 toneladas, 55 metros de comprimento, uma tripulação com 45 homens e um armamento de quatro canhões laterais de calibre 64 e duas torres sobre eixos com canhões de calibre 80. Uma imponente nave de guerra!
 
                                                      



(corveta inglesa HMS Cormorant)

                                   
                                   






Neste mesmo dia as principais autoridades locais foram a bordo do Cormorant e parlamentaram com seu comandante Hubert Schumberg sobre os fatos ocorridos na baia. Nesta visita o capitão inglês apresentou um ofício relatando seus atos às autoridades locais, porém, eles se recusaram a receber o documento. Mas, o chefe naval nada fez para revogar seus atos anteriores e ainda acusou os visitantes presentes de serem cumplices do tráfico negreiro. Sabedores disso e vindos da localidade, alguns jovens destemidos resolveram tomar atitudes viris em nome da soberania nacional, sendo nisto acompanhados pelas tripulações dos navios apresados.

Todos eles desembarcaram no dia seguinte pela manhã na Ilha do Mel, aonde existia a obsoleta fortaleza Nossa Senhora dos Prazeres, e após entendimentos com o comandante da mesma, capitão Joaquim Ferreira Barbosa, fizeram incansáveis preparativos para o enfrentamento. Durante toda a noite, debaixo de muita chuva, um intenso fluxo de embarcações de pequeno porte levou para a fortaleza muita pólvora, armas portáveis, explosivos e projéteis. Para lá também seguiram carpinteiros e ferragens. Com muita boa vontade aquelas pessoas e a pequena guarnição da fortaleza, conseguiram montar entre dez e quatorze peças de artilharia sobre paus e pedras e dota-las das necessárias guarnições e respectivas munições.
                                                               

 (parte da muralha e entrada da citada fortaleza – foto de Paulo Yuji Takarada)

 
 
 
Eram cerca de nove da manhã de 1.° de julho de 1850, quando o  HMS Cormorant apareceu no rumo à barra, trazendo consigo a reboque os barcos brasileiros. Como o barco inglês vinha lento, o então comandante da fortaleza enviou um ofício ao capitão inglês, através de um escaler comandado por um sargento. Os termos deste ofício faziam menção de que o cruzador de guerra deveria seguir viagem sem os navios apreendidos, deixando estes em poder das autoridades locais e na desobediência deste ofício a fortaleza faria fogo ao vapor da Royal Navy. O ofício nunca foi entregue, pois o escaler nacional antes de chegar a nave foi repelido com um tiro de advertência de pólvora seca pela tripulação inglesa.


Diante disso a fortaleza revidou com um tiro e novamente o Cormorant fez fogo, agora para valer e visando a ilha, sendo em resposta alvejada por várias bombas de calibre 80 e balas 36. A guarnição da Ilha do Mel fez novos disparos, agora com todas as peças da fortaleza e nos trinta minutos que se seguiram houve o confronto entre a artilharia brasileira da fortaleza e os seis canhões do cruzador HMS Cormorant. O canhoneio brasileiro só cessou quando aquela nave sempre em movimento saiu do alcance das bocas de fogo brasileiras.

                                                             


      (imagem da ilha do Mel e de sua fortaleza - foto de Paulo Yuji Takarada)

    
 
 
(continua...)

domingo, 3 de maio de 2015

Populares no século XIX bombardeiam navio de guerra britânico no Brasil (I).

                                              Introdução:

 
Bom se começar dizendo-se algo sobre os britânicos e seu império mundial, que é de domínio público e conhecimento geral. A Grã-Bretanha em tempos idos, aproveitando-se de uma época a ela propicia  e ainda da pobreza e fraqueza de muitos povos atrasados, usando de dinheiro e força militar apoderou-se de muitas terras espalhadas pelo mundo, colocando aos seus habitantes debaixo do seu guante imperial. Para interligar a metrópole as colônias desenvolveu uma grande frota mercante, que transportava homens e bens pelos oceanos. E a fez guardar por uma poderosa marinha de guerra, que no seu auge acabou sendo equivalente ao de duas potências, o que colocou a generalidade dos países submetidos a ela.
 
                                                              
 (bandeira britânica)


 
  

 
Também a partir da segunda metade do século XVIII aquele país criou e manteve uma grande indústria baseada no uso industrial das máquinas movidas a vapor d’agua para abastecer de bens industriais ao seu país e vender os seus excedentes no exterior. Era um estado poderoso, ao qual nenhum país poderia contrapor o seu próprio poder.
                                                          
(imagem da revolução industrial britânica)
 

Já no século XIX a Grã-Bretanha, por razões de política interna, o que se deu entre os anos de 1806 e 1807, acabou com o tráfico negreiro em todo o seu Império e mais tarde, em 1833, proibiu o próprio trabalho escravo.
O Brasil surgido como colônia portuguesa foi submetido a sua metrópole de 1500 a 1821, sendo penosamente colonizado e ocupado, primeiro por uns poucos portugueses, auxiliados por certo número de indígenas, com o tempo reforçados paulatinamente por jovens mamelucos (descendentes de brancos e índias), que unidos e agindo com muita coragem desbravaram sertões e os ocuparam. Portugal, porém, era pequeno e tinha limitada população, parte da qual pereceu nas navegações e conquistas feitas pelo estado português. Era impossível fazer-se a colonização de uma terra tão vasta com tão poucas pessoas. Por isto recorreu-se a escravização dos negros oriundos da África, contando-se com a vil cumplicidade da Igreja Católica, que apoiava este desumano uso, para assim garantir rendas e bens a ela própria. Tal a principal razão da escravatura negra no Brasil, promovida e mantida por 321 anos por Portugal e seus reis.
A independência do Brasil fez-se através de uma aliança politica entre o príncipe real lusitano, Dom Pedro, alguns nacionalistas, idealistas e patriotas, e muitos senhores de terras e de escravos, o que impossibilitou a libertação dos cativos e a proibição do tráfico nefando. Pois, o novo país vivia essencialmente da sua produção agrícola, então totalmente baseada nos braços escravos. Liberta-los a todos, seria arruinar-se a sua economia. Por isto ainda sob o governo de Dom Pedro II e quase até o seu final manteve-se a escravidão negra, que, como todos sabemos e salvo algumas concessões pontuais perdurou até 1888, ou seja, por 66 anos.
A produção agrícola brasileira de café e açúcar, por mãos escravas, superava a produção colonial inglesa dos mesmos produtos nas Antilhas e tinha preços mais baixos, que estas. Foi por isto que durante toda a primeira metade do século XIX, o Brasil, esteve sob intensa pressão inglesa para terminar com o tráfico de escravos africanos. O que começou, já aos tempos da regência e depois no posterior reinado de Dom João VI e prosseguiu mesmo após a independência brasileira.
 
Estas fortes “démarches” geraram em 1831, a Lei de 07 de novembro de 1831, por meio da qual todos os escravos africanos que entrassem no Brasil a partir daquela data seriam declarados livres e os contrabandistas de escravos sofreriam severas penalidades. Diploma, este que teve eficácia por poucos anos, pois mais ou menos a partir de 1837 o tráfico já tinha retomado sua força e alguns anos depois atingia proporções nunca antes vistas.
Foi diante disso, que o parlamento britânico, aprovou a lei chamada “Bill Aberdeen”, na verdade, o  “Slave Trade Suppression Act”, ou “Aberdeen Act”, que foi a lei que autorizava os ingleses a aprisionar quaisquer navios suspeitos de transportar escravos no oceano Atlântico, medida a ser cumprida pela sua poderosa marinha de guerra.
                                                             
(captura de navio negreiro por uma nave militar britânica)
 


Tais os antecedentes desta história, que devem ser necessariamente relembrados. Passo agora aos fatos objeto deste artigo.


(continua...)